Um desafio aos trabalhadores portuários
Desde 1990, quando se iniciaram os trabalhos para promover a modernização dos portos brasileiros, discute-se a conflituosa questão que envolve as relações trabalhistas. O problema é decorrente das mudanças tecnológicas que alteraram os métodos de movimentação de cargas nos portos. Os novos equipamentos de bordo e terra passaram da mecanização para a automação – e nos países desenvolvidos já estão na robotização – e os de contêineres contribuíram fortemente para maior eficiência, produtividade e segurança nas operações.
Se um setor deve estar sempre à frente das mudanças tecnológicas, este deve ser o portuário, entrada e saída de um país. Hoje, cerca de 90% das operações do comércio internacional se dão pelos portos do mundo. Modernizar as atividades portuárias deve ser uma ação permanente.
Em 1973, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), preocupada com as repercussões sociais provocadas pelos avanços tecnológicos na atividade portuária, promoveu a Convenção nº 137. A convenção faz recomendações a governos, empresários e trabalhadores sobre medidas que mitiguem os efeitos dos novos equipamentos no trabalho portuário. Há 43 anos a OIT sugere o levantamento do contingente de trabalhadores nos portos de cada país e um controle para que se mantenha apenas o número de trabalhadores necessários. Aqueles que não dependem do trabalho na atividade portuária podem ser afastados. Os trabalhadores excedentes devem ser realocados ou receber estímulo para a aposentadoria.
No Brasil, em 1993, a Lei nº 8.630 fundamentou-se nas proposições da OIT e determinou a criação do Órgão Gestor de Mão de Obra (OGMO) em cada porto com a responsabilidade de manter o registro dos trabalhadores vis-à-vis a demanda de mão de obra, criou estímulos para a aposentadoria dos trabalhadores e planos de demissão voluntária nas Companhias Docas. Um fundo foi instituído para incentivar a retirada de trabalhadores excedentes. Durante quatro anos foram arrecadados cerca de R$ 280 milhões, mas o fundo sofreu com desvios e irregularidades. Boa parte do valor arrecadado acabou em mãos erradas.
De 1993 para cá, o contingente de trabalhadores nos portos diminuiu muito – de 60 mil para cerca de 23 mil atualmente. Os velhos conflitos, porém, não apenas continuaram, mas recrudesceram. Em 2013, a Lei nº 12.815 demagogicamente restabeleceu certo monopólio dos trabalhadores avulsos dentro dos portos, uma reserva de mercado inconstitucional.
Se a atividade portuária fosse mais eficiente e segura, o maior beneficiário seria o trabalhador. Mas os líderes sindicais parecem não se importar com isso. Continuam reivindicando a requisição compulsória de trabalhadores, a manutenção de tarefas obsoletas e as ameaças de greve. Mais de 40 anos depois, não atentaram para as recomendações da OIT.
As lideranças dos trabalhadores nos portos precisam iniciar um processo de orientação a seus liderados sobre as inexoráveis mudanças no setor. Devem exigir do governo uma avaliação médica dos trabalhadores, estimulando a aposentadoria dos que reúnem condições legais para isso. Precisam apoiar programas de treinamentos permanentes para que a mão de obra saiba operar novos equipamentos ou atue em atividades fora do porto. E podem levantar suas vozes para pressionar por mudanças nas políticas de transportes que promovam melhores portos, com bons sistemas de dragagem, acessos multimodais mais integrados e inteligentes e menos afetados pela burocracia, que hoje rouba competitividade dos terminais brasileiros.
Este é o repto que temos feito aos líderes dos trabalhadores portuários: que não se acomodem nas reclamações por mais direitos e vantagens, mas que lutem por mudanças. Podemos fazer agora as transformações que o País adia há 25 anos na infraestrutura de logística e na presença mais racional do Estado na atividade portuária. Seria ótimo para os trabalhadores e para o Brasil.