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Governo estuda conceder áreas públicas em portos sem licitação

A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) está prestes a baixar uma nova resolução para regulamentar os arrendamentos portuários com o objetivo de adequar a norma ao crescimento do comércio exterior do país, informa o diretor-geral da autarquia, Fernando Fialho.

A proposta do novo texto cria uma série de figuras não previstas na Lei de Modernização dos Portos (de 1993) e inclui a possibilidade de exploração de áreas públicas sem licitação. A investida é criticada por especialistas em regulação e por empresários que tiveram que passar pelo crivo concorrencial para arrematar seu quinhão portuário. A lei de modernização dos portos admite a operação por meio de concessão do porto público ou arrendamento de áreas portuárias (ambos por licitação) e também a autorização para terminal privativo (que movimente apenas, ou principalmente, carga própria).

A resolução da Antaq que está no forno - provisoriamente classificada com o número 1687/2010 - cria um instrumento de exploração chamado de "permissão de uso temporário", que pode ser firmado sem licitação por até 36 meses para movimentação e armazenagem de carga. O diretor da Antaq explica que o objetivo é acelerar o aproveitamento do espaço dentro do porto público, "apoiando os processos licitatórios, mas permitindo as ampliações necessárias e importantes". Ele cita a movimentação no porto de Santos, que praticamente triplicou desde o início da privatização das áreas sem qualquer grande ampliação, apenas com melhor uso dos espaços existentes. A inovação é controversa. O professor de direito regulatório de transportes e portos do doutorado em direito da Universidade do Vale do Itajaí (Univali ), Osvaldo Agripino de Castro Jr., argumenta que o instrumento viola a previsão constitucional que determina o certame público. "Do jeito que está, vai institucionalizar a insegurança jurídica. Quer dizer, eu sou um arrendatário e participei de uma licitação, mas agora vai existir uma nova figura de curto e médio prazos que dispensa o certame público?", questiona.

Na prática, a modalidade institucionaliza o Termo de Permissão de Uso (TPU), instrumento precário e unilateral que dispensa licitação, mas não tem previsão no arcabouço legal do setor. Hoje, os portos brasileiros contam com 122 TPUs, sendo 53 apenas em Santos. "Acho a figura da permissão de uso temporário extremamente importante para a competitividade portuária. Porém, da forma como está regrada, pode não atender ao que está previsto na Lei 8.630. Quando a área é para ser dedicada a atendimento de um interessado e se fala em investimento, essa figura é arrendamento e exige licitação.

Uma coisa é permitir uso temporário de determinadas operações, outra é entregar efetivamente a área por um prazo que pode chegar até três anos", diz o secretário de Assuntos Portuários e Marítimos da Prefeitura de Santos, Sérgio Aquino. Questionado se a permissão de uso temporário não seria institucionalizar a exceção à regra, Fialho discordou e afirmou que "não se pode engessar a economia". Para ele, o mecanismo não burla a concorrência pública, apenas inverte a ordem do processo, criando uma espécie de prévia do processo licitatório. "Se você não tem certeza que um mercado vai se configurar, há o risco de licitar e provavelmente não ter o rendimento adequado pela área.

Agora, se a unidade é implementada, o mercado cresce e valida, aí acontece o que ocorreu com o Terminal para Exportação de Veículos [a área foi repassada pela Docas do Estado de São Paulo à Santos Brasil, que construiu o terminal para, depois, a administração do porto abrir certame público, vencido pela própria Santos Brasil]", diz Fialho.

"Se a licitação tivesse ocorrido cinco anos atrás, não teria arrecadado nem de perto o que arrecadou, porque antes não era visto como um bom negócio. A licitação foi feita e legitimou a visão de futuro", acrescenta. A realização de licitação ao final dos três anos, porém, não está prevista nos artigos sobre permissão do uso temporário.

"Acho que a agência tem de ser pró-ativa em propor soluções para que os investimentos se organizem mais rapidamente, mas não pode inventar figuras. Saltam aos olhos os mecanismos que fazem com que seja dispensada a licitação, isso afronta a Lei 8.630", avalia a presidente da Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados (Abtra), Agnes Barbeito de Vasconcellos.

Empresários rejeitam mais "novidades"

Outros instrumentos que também constam da proposta de norma em estudo pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) são o contrato de cessão e permissão de uso (ambos firmados entre a autoridade portuária e demais órgãos ou poderes públicos) e o contrato de servidão pública de passagem. No caso da cessão de uso o repasse da área prevê "execução de investimento". "Como um ente público vai desenvolver atividade que gera lucro e competitividade?", questiona Aquino.

Como todos esses instrumentos não constavam da Resolução 55, que a nova norma substituirá, a Associação Brasileira de Terminais Portuários pediu a retirada dessas questões. "A resolução tem de se referir tão somente a contratos de arrendamento e não servir de barriga de aluguel para novidades", diz o presidente Wilen Manteli.

Também no que tange aos arrendamentos há dúvidas. O artigo 34 da proposta especifica que o prazo dos contratos será de 25 anos prorrogáveis por igual período "mediante justificativa". "A Lei 8.630 determina que ao término dos primeiros 25 anos a prorrogação deverá ser automática, desde que cumpridas todas as obrigações. Mas tanto o decreto (6.620/08) quanto a nova norma expressam que será prorrogado 'mediante justificativa', e não explicam quais. Isso gera notória insegurança jurídica para o investidor que, sem visibilidade de que vai ter o contrato prorrogado, deixará de investir, diz Manteli.

Atualmente, a Antaq analisa as contribuições enviadas durante o período de audiência pública. A expectativa é que a resolução seja publicada ainda neste ano.

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